
Cultura organizacional é espelho que molda o relacionamento com cliente
Fonte: Consumidor Moderno, 24/09/2025
Painel no CONAREC debate as estratégias das companhias que refletem o CX e o papel da cultura centrada no cliente.
Quando se fala em preferência do cliente, a cultura da organização faz toda a diferença. “A preferência é o dia a dia do cliente, que se ganha a cada interação”, destacou Cláudia Vale, CEO da Flwow Soluções em CX, ao abrir o painel Cultura centrada no cliente: estratégias para conquistar a preferência, no CONAREC 2025. Ela moderou um bate-papo com a presença de John Rodgerson, CEO da Azul Linhas Aéreas; Jonas Marques, CEO da Pague Menos; e Pierre Berenstein, CEO da Bold Hospitality Company.
Para Jonas Marques, ao estabelecer uma cultura de orientação ao cliente, o grande desafio é entender e conhecer as pessoas que trabalham na companhia. A Pague Menos tem 1.700 lojas abertas, muitas delas operando 24 horas por dia, e 26 mil funcionários. “Dizemos que não é C-level, mas ser-level”, brinca o CEO, destacando a necessidade da alta direção saber como o cliente está sendo atendido in loco.
Assim, ter uma cultura centrada no cliente é menos sobre enxergá-lo como cliente e mais sobre pessoas. “Quem trabalha com CX e não se sentou com cliente na última semana tem algo errado”, acrescenta Pierre Berenstein, da companhia que é dona do Outback, Abbraccio e Aussie no Brasil. Como exemplo, falou que 85% dos sócios-proprietários do Outback começaram atendendo, lavando e cozinhando.
Cultura que inspira
Uma característica das equipes é não apenas atender ao cliente, mas trazer respostas e conseguir resolver problemas. John Rodgerson conta que, a cada semana, envia, por e-mail, um elogio copiando a empresa inteira e reconhecendo alguém. “Nas últimas duas semanas, tivemos um cliente que estava dormindo ao bordo do avião e com frio. Nosso comissário de voo tirou o paletó dele e cobriu o cliente. Você não ensina isso, você inspira isso”, disse o CEO, que também fez uma videochamada com o comissário para parabenizá-lo.
Na semana passada, outro caso chamou a atenção do CEO da Azul. “Nós tivemos uma cliente que estava perdendo a conexão e estava indo para um casamento. Ela não teria tempo para fazer maquiagem e nosso agente do aeroporto em Confins fez a maquiagem da cliente. Isso não é papel do nosso engenheiro do aeroporto, mas fez e isso inspira a nossa cultura para ser diferente”, conta.
Mas, como garantir o entendimento, o engajamento e a aplicabilidade da cultura no dia a dia das corporações? Para Jonas Marques, os números seguem comportamentos. A Pague Menos vem crescendo há quase um ano, a uma taxa de 18% em cada trimestre. “Nossos concorrentes perguntam o que está acontecendo que crescemos três vezes mais do que o líder de mercado. Aí eu explico que é exatamente essa obsessão pela linha de frente”, aponta.
Rituais de cultura e CX
Contar com rituais corporativos é outro pilar estratégico das companhias. “Na Pague Menos, temos rituais muito potentes, como, por exemplo, o Diálogos, que não é uma TV em que eu me dirijo às 1.700 lojas. É um diálogo, ou seja, metade do tempo eu falo, metade eu ouço. As pessoas se engajam, porque elas escutam. A gente tem também o cliente oculto, no qual a gente investe R$ 5 milhões por ano para que todas as nossas lojas sejam visitadas todos os trimestres e as lojas mais importantes, um quarto delas, são visitadas todo mês”, relata Marques. Para as lojas que atendem os 100 pontos no NPS desse cliente oculto que visitou a loja e interagiu com o time, é feita uma celebração e distribuídos os certificados.
Por trás das iniciativas, reside uma visão de que as pessoas se convencem seja pela punição, seja pelo reforço positivo. “A gente acredita no reforço positivo, porque todo mundo nasceu para dar certo. E a gente tem 26 mil pessoas, das quais 25 mil delas são a base da pirâmide. A grande virada da empresa, nos últimos dois anos, foi porque as pessoas resolveram acreditar que elas são importantes”, conta o CEO da Pague Menos.
No Outback, o reforço positivo está estampado nos pins. “Ritual é algo que nasceu com a gente. Para cada pin, tem uma história por trás, um reconhecimento, um fato, uma comemoração ou algo surpreendente – de encantamento para nossos clientes ou até de ajuda com os próprios outbounders”, diz Pierre Berenstein. Além disso, o modelo de sócio faz com que os proprietários das unidades sejam os primeiros guardiões da cultura.
“Rituais são fundamentais. A gente só considera inaugurado um restaurante depois de uma noite que a gente chama de charity night. Porque a gente entende que precisa retribuir para a comunidade”, acrescentou Berenstein. A noite da caridade destina 100% da arrecadação do jantar para doação a uma instituição, que, inclusive, é apadrinhada pela unidade.
Outro ritual é cantar parabéns aos aniversariantes. Foi 1 milhão de “parabéns a você” em 2024, acompanhados de sorvete e caldas cortesias. “São momentos de encantamento de fato. Eu vou ser muito honesto, eu não olho o NPS. Para mim, o fato é o retorno do cliente ao nosso negócio”, frisa Berenstein. “Essa é a métrica mais pura e verdadeira: se eu atendi bem, é quando alguém volta”, justifica.
Humildade para assumir os erros
Reconhecer erros também faz parte. “O ano de 2024 foi o pior ano da Azul. Eu estava a bordo do avião, falando com um cliente. Perguntei se viajava muito e ele disse que sim. E eu falei que queria pedir desculpas. Ele me abraçou e não largou; e disse que precisava que alguém pedisse desculpas. Disse: ‘eu amo a sua marca, mas vocês me ferraram. Eu só queria que alguém pedisse desculpas para mim’. Então, eu criei um relacionamento muito forte com este homem, só através de um pedido de desculpas simples”, relata o CEO.
A iniciativa levou à criação de uma ação de mandar um pedido de desculpas para os clientes. “Essa é uma maneira que a gente tenta inspirar e ensinar todo mundo que nós vamos errar, mas, ao errar, vamos assumir o erro e vamos pedir desculpas”, acrescentou Berenstein.